No post anterior, Máquina Zero (blog), escreveu o seguinte comentário «Um comunista aliado do Irão? Meu caro, os tipos, lá, enforcam gente como você!!!». Os meus dois recentes posts sobre o Irão tinham como principal objectivo fornecer elementos sobre a distorção das palavras de Ahmedinejad nos media ocidentais. Creio que tal não é sem motivos, e que merece a nossa atenção, em particular depois da colaboração dos media na difusão de mentiras na escalada da guerra ao Iraque.
É certo que os partidos comunistas do Irão, opostos ao república islâmica, estão proibidos, e que comunistas têm sido condenados à morte por luta armada contra o estado. Não estou a subscrever a pena de morte (sejam comunistas ou outros), nem a aliança estado-relgião, embora devo sublinhar que o Irão tem uma sociedade mais aberta, plural e democrática do que o retrato dos media geralmente permite inferir. O Irão é uma sociedade jovem e interveniente, com movimentos sociais activos. Vejam-se as recentes lutas laborais. O clima de ameaça pelos EUA só vem dificultar o movimento progressista, só vem radicalizar posições e reforçar o apoio ao governo.
Posso legitimamente separar a natureza do sistema iraniano, expressar oposição à natureza islâmica e capitalista do governo de Ahmedinejad e simultaneamente saudar a sua resistência às ingerências do imperialismo. Posso ter sérias reservas sobre a opção de energia nuclear como fonte alternativa ao petróleo, e defender o direito do Irão a desenvolver o seu sector energético por essa via sem. Posso inclusivamente ser categoricamente contra a proliferação de armas nucleares, e contudo constatar que face à presença de armas nucleares em Israel, ou face aos recentes acordos nucleares entre a Indía e os EUA, existem contradições entre as tomadas de posição dos líderes ocidentais: as pressões sobre o Irão não são fundadas no princípio da não-proliferação, mas interesses estratégicos dentro da actual conjectura.
A mim preocupa-me sobretudo o clima e retórica de conflito, fundada em meia-verdades, afirmações extraidas do contexto, manipulações e factos por estabelecer. Preocupa-me ouvir uma notícia sobre o Irão com a sequência "Irão bla-bla-bla nuclear bla-bla-bla Ahmedinejad disse que Israel vai desaparecer" e depois ler o texto original e ver um conteudo num sentido contrário. Estas justaposições não são fortuitas. Recordo que a Casa Branca repetidamente nos seus discursos pre-invasão do Iraque, falava do Onze de Setembro e de Saddam Hussein. Embora em geral não fosse atribuida responsabilidade a Saddam, essa associação cresceu na mente pública tendo ajudado a angariar apoio nas fases iniciais da operação. Não tenho dúvidas que agora também se está delibradamente a construir uma narrativa nestas linhas: Irão, regime ditatorial, com ambições expansionistas, desenvolve armas nucleares [algo ainda não estabelecido] e proclama querer usá-las para destruir Israel. Ora creio que esta narrativa é falsa, e é urgente desconstruí-la sobre o risco de ser assímilada e facilitar a aceitação de sanções ou intervenções militares preemptivas.
domingo, maio 14, 2006
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3 comentários:
Portanto, meu caro, você acha que o Irão é um país que caminha para a Democracia e que as críticas ao facto de ser uma teocracia assassina, sem Direitos Humanos, só dificultam esse caminho, certo? Você defende, portanto, o silêncio. Estou a vê-lo, se tivese nascido uns anos antes, a guuardar silêncio perante a inauguração do primeiro campo de concentração alemão. E você acha que é incorrecta a ideia, transmitida pelos media, de que o presidente iraniano afirma ou afirmou que Israel deve ser destruído, deve desaparecer do mapa, deve ser 'transferido' para aEuropa, etc, etc? Então, meu caro, confirma-se uma das teorias mais interessantes da Twilight Zone: eu e você vivemos em mundos paralelos, parecidos, mas diferentes...
A máquina, definitivamente, é zero. Não sabe ler... nem pensar. Se soubesse teria vergonha em dizer que o "seu caro" acha que o Irão caminha para a Democracia, uma vez que no post original nada indica essa opinião. Em segundo lugar acredita que ameaças de ataques são críticas. E, em terceiro, não percebeu o objectivo com que a carta foi traduzida, o de, precisamente, esclarecer a manipulação que os media fizeram das afirmações do presidente do Irão.
Efectivamente vive noutra dimensão. Não viveu, como o resto de nós, a vergonhosa forma como foi "justificada" a invasão do Iraque. Se bem lembro, abrir a boca para dizer que os interesses dos Estados Unidos nada tinham que ver com "liberdade duradoura" e que se tratava da rapina e destruição do país era tomar partido pela ditadura de Saddam.
Provavelmente lá, no "mundo paralelo" do caríssimo "zero", onde tudo é preto ou branco, o Iraque deve-se ter transformado no melhor dos mundos, as pessoas entoarão cânticos aos seus libertadores, o emprego deve ser pleno e as crianças certamente crescem alegres e saudáveis. Tão bom que se recomenda repetir a dose no Irão.
Nena
Blog muito bom parabens...
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