«Empreender» não é mais que experimentar, decidir-se a fazer alguma coisa, pôr em execução, tomar iniciativa. Enquanto termo económico pode ter um uso relativamente recente (ver), mas o conceito é tão antigo como, pelo menos, o próprio capitalismo, no qual os trabalhadores desprovidos de meios próprios de produção e terra se viram forçados a vender a sua força de trabalho ou, quando possível, tomar iniciativa e lançar um pequeno negócio, ou empreendimento. Isto é, o termo «empreendedorismo» terá uma vida recente, mas o conceito é antigo.
Em Portugal é lamentável ver o conceito arremessado como bode expiatório do nosso atraso económico. Que os portugueses são pouco empreendedores, não arriscam, não tomam iniciativa, só querem um emprego permanente para dormir à sombra da bananeira e ter um colega que lhe pique o ponto, os espanhóis sim são empreendedores, vejam como eles estão tão melhores, há bolachas espanholas por tudo é que parte.
Eu cá detesto este tipo de generalizações sobre povos inteiros, sobretudo quando não são correctos e passam um pano molhado sobre outros factores sociais, políticos e económicos bastante mais importantes para explicar o estado actual da nossa situação presente do que qualquer defeito ou falta de iniciativa dos lusitanos. Coisas com algum impacto, que dão cabo de qualquer esforço empreendedor. Basta pensar na destruição do nosso sector agrícola, das pescas, de sectores industriais por medidas subservientes dos nossos dirigentes aos interesses da UE. A complicada e labiríntica burocracia para montar um negócio, e o peso fiscal relativo que recais sobre as micro e pequenas empresas, por contraste com a mão leve sobre as grandes empresas e monopólios.
Além do mais, há amplas demonstrações de como os portugueses são capazes de tomar a iniciativa e criar novos formas de produção. Não me refiro aos casos emblemáticos que são sempre repetidos quando é necessário dar exemplos de excepção (caso da YDreams, sem lhe tirar qualquer mérito, ou da invenção da Via Verde). Penso nos milhares de portugueses que criam o seu próprio negócio e trabalham no duro – como a família e amigos do meu café de bairro. Penso nos milhares de emigrantes portugueses que concluindo não terem condições em Portugal para vingarem, enfrentam o medo e o desconhecido vão para o estrangeiro onde trabalham e montam negócios. Penso num dos mais belos empreendimentos humanos de Portugal democrático, a Reforma Agrária, onde trabalhadores agrícolas de baixa instrução ocuparam terras inutilizadas e abandonadas e através do seu trabalho colectivo e organizado, com colaboração técnica por eles mesmos solicitada, tornaram milhares de hectares produtivos, trouxeram vida às suas localidades e deram um grande contributo à produção alimentar nacional. Agora Portugal é um país sem soberania alimentar. Falhou a Reforma Agrária por falta de empreendedorismo, ou por inveja e ódio das classes dominantes à iniciativa (e sucesso) das classes trabalhadoras? E querem melhor exemplo de que Portugal tem empreendedores do que as dezenas de cursos de formação que ensinam empreendedorismo?
Há quem venha dizer que nos EUA as crianças apreendem cedo a procurar emprego, vendem limonada à porta de casa, trabalham como adolescentes no McDonalds. Nos países escandinavos, depois do liceu saiem de casa e fazem-se à vida. Apreendem cedo a ser empreendedores. Meus caros, estão esquecidos do flagelo do trabalho infantil em Portugal, e a difícil campanha de o combater, e ter as crianças nas escolas? Querem que os nossos adolescentes apreendam, trabalhando por salários de exploração para um monopólio que promove a obesidade? Querem comparar o mercado imobiliário e o nível salaria e de vida da Escandinávia com Portugal?
Embora, como disse, não goste de generalizações, parece-me que em Portugal mais do que uma falta de empreendedorismo, de capacidade de trabalho, imaginação, e iniciativa, existe é um círculo restrito de galos nos poleiros, que proclama às sete colinas os mandatos divinos do mercado livre, mas depois é incapaz de ver os pintos a crescerem. Não é que estes não seja capazes de criar o seu próprio poleiro, ou nicho económico, mas só um pequeno número o consegue fazer contrariando, além das dificuldades naturais, também as picadas dos galos de crista longa.
O perverso é usar-se este conceito como resposta à falta de emprego. Diz-se, está ultrapassado o tempo em que o sector público (ou o mercado) oferece empregos. Se queres ganhar dinheiro, tens de criar o teu próprio emprego, criar um nicho. Este discurso é não só uma desresponsabilização do Estado (e também do sector privado), incapaz de gerar postos de trabalho, mas é um discurso paternalista que atira as culpas perante o cidadão, que não possuiu meios de produção ou acesso fácil ao crédito, que enfrenta um economia onde até os monopólios se queixam. Acham que um cidadão desempregado, ou um trabalhador esgotado, com pouco tempo para a família, não quer uma vida melhor? Que não a persegue por falta de imaginação, de iniciativa? Somos parvos, ou quê? Deixem lá os vossos tronos e cheirem a merda! Querem importar o "sonho americano" mas omitem que este é uma produção de hollywood. Que a maior parte dos ricos dos EUA, são-no por herança. Que há de facto casos de pessoas que conseguem ultrapassar as barreiras de classe social e financeira, através do seu esforço e determinação, mas que para cada Bill Gates, há dezenas de milhares de "Joe Gates", que também apesar do seu esforço, trabalho suado e determinação não conseguiram ganhar a lotaria e tornar-se bilionários. Não necessariamente por menores capacidades, mas porque a competição é assim. É aceitável haver uma corrida em que uns têm ténis de marca e começam com metros de avanço, e outros têm chanatas rotas e saco de batatas às costas? Mesmo começando todos de igual, numa corrida é natural que apenas um ganhe, ou que apenas três ganhem medalhas. Mas é esse um modelo de sociedade?
No jornal gratuito O Global, do passado dia 18 de Novembro, uma notícia curta dava conta das palavras do Presidente Cavaco Silva numa mensagem que enviou à Semana Global Empreendedorismo 2008 (sem dúvida uma iniciativa de um grupo muito empreendedor). Disse Cavaco:
"Num tempo em que o conceito de emprego para a vida se torna cada vez mais obsoleto e em que o funcionameno do mercados e das relações de trabalho se alteram profundamente, o empreendedorismo ganha novas razões para se desenvolver e frutificar. (...) Precisamos de aceitar que o fracasso é, muitas vezes, parte integrante do processo de aprendizagem necessário para chegar ao sucesso"Aí temos espelhado a desresponsabilização, a acusação aos portugueses, a defesa de um sistema onde perder é natural. Mas pergunto, enquanto se fracassa, como é que se come? Como é que se paga a casa? Como é que se sustem família? É essa a única maneira de organizar uma sociedade, onde há produção de riqueza, mas esta está nas mãos de uma minoria (ganhadora), que a prefere usar para especular e gastar em luxos do que proporcionar meios de ganhar a vida aos restantes. Não se trata de esmolas, mas de oportunidades para trabalhar e ganhar a vida. Será que esta malta tem razão, e preciso de ir tirar um curso de empreendedorismo? Ah, mas eis que as páginas centrais da mesma edição da Global me dá novos exemplos de como os portugueses são empreendedores. É o Gina que apanha bolas de Golfe perdidas no Estoril, lava-as com lexívia e revende-as:"vinte bolas a 15 euros. Very cheap, very cheap." Faz uns 100-150 euros num dia bom. Por mês ganhará mais que o salário mínimo nacional. Ou, o Carlos e Isabel que vão para as feiras vender livros, velharias e antiguidades. Ou, o "Ernesto das galinhas", proprietário de uma loja de tintas em Guimarães, que face ao baixo escoamento dos seus produtos começou por oferecer presuntos e agora por cada lote de sete latas de tinta oferece um galo da raça pica-no-chão. Ou, de novos esquemas de investimento em pirâmide, estilo Dona Branca. Eu também gosto de pensar os arrumadores de carros de Lisboa como empreendedores. Antes eram sobretudo toxicodependentes, que faziam dinheiro por abanar o braço junto a um lugar de estacionamento vazio, e jogando a ameaça de dano automóvel inferida pelo condutor (mas, penso, como pouco base na experiência). Foi esta "profissão" que, nos anos 80, trouxe para a luz do dia, e para fora dos bairros degradados, a escala e dimensão do problema da toxicodepência, sobretudo de heroína. Agora vêem-se muitos arrumadores não por toxidependência, mas pela mais trivial pobreza. Querem melhor prova do que os portugueses também podem ser empreendedores: até os nossos toxidependentes foram capazes de identificar um nicho económico e criar um "franchising".
Um comentário:
Desculpe-me,mas ocavaco não é aquele que desbaratou 17 Tonelada de ouro na Wall Street,daquele que desbaratou os fundos da UE por seus amigos(gostaria de saber por cada euro aqui entrado qual foi o utilizado em coisa útil para a sociedade-claro,que os jeeps não contam assim como os montes,as putas,as viagens,etc),o tal que tem como amigos os duarte limas,os oliveira e costas,os dias loureiros,e restante escumalha,pq se houvesse JUSTIÇA eles não estariam a gozar...
O modo q vejo isto é,um bando que tem nas mãos a segurança, forças armadas,tribunais,dinheiro,impostos epara mim,são criminosos como podemos ver nos seus cabedais.Ah! e os bancos/seguradoras-dão prejuízo,dá-se-lhes dinheiro que já não irão para hospitais,escolas-vão para a cona deles!!!
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