Quando um estado emprega empresas privadas com tamanha magnitude, pondo o tema da transparência e isenção da atribuição dos contactos de parte, há que perguntar qual a hierarquia de comando? Como funciona? Não é de admirar casos como este, em que mercenários da Blackwater desarmaram soldados dos EUA sob ameaça de disparar sobre eles.
Quem de facto conduz a guerra, e no interesse de quem? O corpo executivo e os accionistas destas empresas terão interesses que poderão não ser convergentes nem mesmo com o governo de Bush. Podem ser constituídos por pessoas de diferentes países. Os contratados no terreno são seguramente de vários países, havendo inclusivamente portugueses no Iraque empregue por estas empresas. Mas não são os tugas que me preocupam, são os maluquinhos que estas empresas foram recrutar um pouco por todo o mundo que ganharam a sua experiência em conflitos violentos. Quem assume a responsabilidade pelas suas acções. O governo dos EUA já garantiu isenção jurídica no Iraque para as actividades destas empresas. Também não serão julgados nos EUA.
Recomendo um filme que sai este ano War Inc (já disponível por aí) de Joshua Seftel, em John Cusack representa um assassínio empregado por uma empresa privada chamada Tamerlane, cujo director é o vice-presidente. A empresa foi efectivamente contratada pelo governo para ocupar a república (fictícia) do Turaqistão. Porque de facto um país dar-se ao trabalho e sofre as represálias políticas de invadir um país, se pode simplesmente contratar um empresa para o fazer. Além do mais, a Tamerlane não só pode ocupar militarmente um país como o reconstrói ao modelo ocidental, e toma passos para gerar novos conflitos e manter a roda de guerra-reconstrução sempre em andamento.
Uma excelente sátira ficcional, só excedida pela ironia das afirmação de George Bush e Condeleeza Rice a propósito da entrada da Rússia no território da Geórgia, após esta ter invadido a Ossétia do Sul. Disse Bush:
«A Rússia invadiu um país vizinho soberano e ameaça um governo democrático eleito pelo seu povo. Tal acção é inaceitável no século vinte e um.»Ou melhor ainda. Disse Rice, na capital da Geórgia, Tbilisi (também conhecida em português como Tíflis):
«Não estamos em 1968 e na invasão da Checoslováquia, onde a Rússia pode ameaçar um vizinho, ocupar a sua capital, derrubar o seu governo, e ficar incólume. As coisas mudaram.»Sim. Estamos no século vinte um. Onde apenas os EUA pode ameaçar um país longínquo, usando mentiras para justificar uma guerra, e apesar da falta de sanção das NU, ocupar esse país por tempo indeterminado, fomentando guerra civil, e pilhando os seus recursos. Ah, Israel também pode ameaçar o Irão, mas se quiser tomar alguma acção tem que pedir ao Padrinho.
A propósito do uso de mentiras para justificar a guerra, as evidências vão-se acumulando, mas o governo dos EUA permanece incólume. No seu mais recente livro, o jornalista Ron Suskind, «O Modo do Mundo: uma história de verdade e esperança numa era de extremismo» (The Way of the World: A Story of Truth and Hope in an Age of Extremism) demonstra como antes da invasão, em Janeiro de 2003, os EUA e a Grã-Bretanha reuniram com Habbush, o então chefe da Intelegiência sob Saddam, numa missão secreta desta à Jordânia. Na altura, Habbush revela que não existem armas de destruição massiva (ADMs), que o programa de armas biológicas foi terminado, refutando toda a argumentação dos EUA. Mais, revela que Saddam não acreditava na invasão dos EUA, pois pressentia o Irão como a grande ameaça na região. Por isso temia dar qualquer sinal ao Irão que o Iraque não tinha armas nucleares, e portanto desprotegido.
A reacção da Administração Bush perante estas revelações é de que não ajudam a justificar a invasão. E decidem ignorar a informação de Habbush, evidencias que Saddam havia tentado prender um operativo da al-Qaeda, Abu Musab al-Zarqawi (e que portanto não havia relação Saddam—al'Qaeda—Onze de Setembro, o relatório do embaixador Joe Wilson que concluiu não existirem quaisquer evidências da venda de tubos de alumínio pelo Niger ao Iraque. (Para um mais detalhes sobre o que a Casa Branca sabia e ignorou, e como vendeu a guerra ao povo estaodunidense ver:«Hubris: The Inside Story of Spin, Scandal, and the Selling of the Iraq War» de Michael Isikoff e David Corn.
Na argumentação apresentada nas ONU, Colin Powell fez uso de informações mais convenientes (mais de pouca credibilidade, mesmo no circuito de intelegiência dos EUA), como as obtidas resultantes da tortura no Egipto de Ibn Sheikh al-Libi, membro da al'Qaeda.
Entretanto os EUA invade o Iraque, e Habbush foge para a Jordânia, como previamente acordado. Mas começam então a surgir dúvidas sobre as evidências apresentadas sobre a existência de ADMs, em particular Joe Wilson vem a público dizer que a Casa Branca foi avisada, antes da invasão, que o Iraque não teria comprado os tubos de alumínio ao Niger, que Powell havia mostrado na sua apresentação. Wilson é punido com uma fuga de informação criminosa, no qual a identidade da sua esposa, Valerie Plame, uma agente secreta da CIA, é tornada pública, pondo a sua actividade e vida em risco.
A Casa Branca começa a temer que Habbush revele as informações que havia passado aos EUA e GB. A Casa Branca decide então pagar $5 milhões de dólares a Habbush, inicialmente apenas para o manter calado. Mas no outono de 2003, fazem Habbush falsificar uma carta, datada como sendo de Julho de 2001, de Habbush a Saddam, onde este, num única carta, confirma todas as alegações que os EUA faziam sobre ADMs do Iraque e sobre uma ligação do Iraque a Mohamed Atta, à al'Qaeda e portanto aos ataque do Onze de Setembro. A carta claro depois é alimentada à imprensa, e dá-se um ciclo notícioso de reforço da argumentação da Casa Branca. Na verdade tratou-se de uma manobra criminosa de desinformação do povo estadunidense. O que levantou suspeitas em alguns círculos, incluindo o jornalista Suskind, era o facto da carta ser tão exaustiva, tão conveniente.
Um comentário:
O Zé Colmeia pôs um par de patins no BEs...
Éramos pra estar de férias, mas estes gajos são de mais... Ri-te a bom rir no anti-troll
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