quinta-feira, outubro 16, 2008

Batalha eleitoral nos EUA

No próximo dia 4 de Novembro, os olhos do mundo irão acompanhar atentamente as eleições dos EUA, para ambas as câmaras do Congresso e, particularmente, para a Casa Branca. Apesar do seu declínio como potência económica, os EUA constituem ainda a principal potência imperialista global, são responsáveis por metade das despesas militares mundiais, e possuem centenas de bases militares em 36 países estrangeiros. O resultado eleitoral terá, inevitavelmente, reflexo sobre o decurso histórico global, em particular em zonas de grande tensão como o Médio Oriente e o Cáucaso.

O dia das eleições será o culminar de um processo que teve o seu início há quase dois anos, logo após as eleições intercalares de 2006, envolveu um longo período até à nomeação dos candidatos dos Partido Democrata (PD) e Republicano (PR), e superou todas as anteriores eleições em termos de angariação de fundos: 1.2 mil milhões de dólares (somando os fundos do PD e PR), quantia 81% superior à do período homólogo nas eleições de 2004 (ver).

Contrariando a tendência história mais recente, o PD tem superado o PR na recolha de fundos, o que descreve em certa medida a tendência de voto da burguesia Estadunidense e certamente reflecte que na corrida para a Casa Branca o dólar é quem mais ordena. As exigências financeiras e a bipolaridade imposta pelo sistema eleitoral e pelos média tem ofuscado a existência de outras candidaturas, fora do habitual espectro do PD e PR. Na verdade existem ao todo 6 listas candidatas à Casa Branca, entre as quais, pelo seu caracter mais progressista, destaco apenas duas.

Ralph Nader, uma voz anti-monopolista e pela defesa do consumidor, volta a candidatar-se, como independente, juntamente com Matt Gonzalez. Recorde-se que Nader nas eleições de 2000, enquanto candidato do Partido Verde (PV), quase atingiu os 5% de votos a nível nacional, meta necessária para que este partido viesse a receber financiamento federal. A lista do PV em 2008 distingue-se por apresentar duas mulheres, uma afro-americana e uma latina, Cynthia McKinney com Rosa Clemente. McKinney foi, enquanto membro da Casa de Representantes pelo PD, das vozes (e voto) mais activas contras as políticas reaccionárias e imperiais de Bush, pela investigação dos eventos do 11/Setembro, e pela defensa das vítimas do Furação Katrina. O seu “radicalismo” conduziu à sua derrota, durante as primárias do PD, para a reeleição como representante do seu distrito no Congresso.

Todas as atenções, porém, estão apontadas para as candidaturas “viáveis” de Obama/Biden e McCain/Palin. De pouco valerá recordar as inconsequentes convenções partidárias, feitas para televisão, e as escolhas dos candidatos vice-presidenciais: o experiente mas tépido Joe Biden (PD) e Sarah Palin (PR), inexperiente e extremista religiosa e política. Ou descrever os insossos debates televisivos, que pouco terão contribuído para esclarecer as posições dos candidatos. Ou descrever os múltiplos ataques televisivos à personalidade dos candidatos. Ou recordar as inúmeras peripécias da corrida presidencial, como a tentativa de golpada de McCain ao interromper a campanha para regressar a Washington e defender o acto de Bush/Paulson de disponibilizar 700 mil milhões de dólares destinados a socorrer diversas instituições financeiras (valor que ultrapassa os orçamentos anuais conjuntos dos ministérios Estadunidenses da Educação, Saúde e Defesa). A discussão pública sobre os temas de maior importância para os Estadunidenses tem sido parca e pouco diferenciadora.

Uma vitória de Barack Obama terá sem dúvida grande significado, sendo o primeiro presidente africano-americano. Existem sem dúvida diferenças entre eles, em termos da sua experiência (Obama como constitucionalista, McCain como senador de longa data), na postura diplomática face ao resto do mundo, no entendimento de matérias económicas e medidas a tomar, nos grupos e sectores sociais que os influenciam, e nas suas nomeações governativas e judiciais. Mas ambos, por exemplo, aceitam uma continuação da presença militar ocupante no Iraque, uma escalada militar no Afeganistão, e ataques preventivos ao Paquistão (sem conhecimento prévio do seu presidente). No seio do PD é marcante a diferença de discurso face ao início das primárias, quando a presença de outros candidatos, como Edwards e Kucinich, forçaram todos os candidatos a discutir os problemas que afectam a classe trabalhadora empobrecida.

As sondagens a que temos acesso projectam uma vitória de Obama. Contudo, as sondagens apresentadas pelos média portugueses são a nível nacional. O escrutínio porém é repartido por estados. Cada estado elege um número de delegados para o colégio eleitoral, e é a maioria neste colégio que elege o presidente. Como a derrota de Gore para Bush, em 2000, demonstrou, é possível assegurar a maioria dos votos a nível nacional, mas perder as eleições no colégio. Isto reduz a corrida eleitoral a apenas alguns estados, os chamados estados pendulares (swing states), cuja vitória por um dos partidos não está à partida assegurada, em particular, entre estes estados, aos que elegem um maior número de delegados ao colégio eleitoral. Os votos no colégio de um estado como a Califórnia (55) ou o Texas (34) são quase garantidos para o PD e PR, respectivamente. Por outro lado, vitórias em estados como Ohio (20) e a Florida (27) podem ser determinantes para assegurar a eleição. Nestes estados, a afluência às urnas poderá repercutir no resultados finais. A taxa de abstenção nacional nas corridas presidenciais tem variado, entre 1988 e 2004, entre os 47-50%.Obama tem alguma vantagem, neste respeito, tendo sido capaz, no início da campanha, de mobilizar muitos novos eleitores. Tendo em conta o escrutínio por estado, alguns média projectam uma vitória de Obama, embora este ainda não tenha garantido os 270 votos no colégio eleitoral (ver).É de esperar que o PR tente fazer uso de pressões e fraude para alcançar pequenas margens de vitória locais, com impacto no resultado nacional, como sucedeu na Florida em 2000 e Ohio em 2004.

O certo é que estas eleições põem termo à era Bush/Cheney, que tanto dano causou a nível doméstico e internacional. A menos de 100 dias da saída da Casa Branca, Bush já dá mostras de estar farto do encargo e querer ir descansar para o seu rancho.

Contributo para o «Jornal da Voz do Operário»

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