sexta-feira, outubro 08, 2004

Money, Money, nas eleições dos EUA

O primeiro debate televisivo entre o presidente Bush e o senador Kerry poderá não ter mudado a opinião dos que assistiram ao espectáculo coreografado. As sondagens pós debate parecem indicar uma vitória de Kerry, e é significativo que os editoriais dos jornais das principais cidades dos EUA tenham declarado a vitória de Kerry, que conseguiu projectar uma postura forte e desgastar a retórica de Bush. Os próximos dois debates serão a 8 e 13 de Outubro.
Algumas sondagens pré debate sugeriam a liderança de Bush, mas as diferenças são em geral inferiores à margem de erro, e portanto não significativas. Ademais, as sondagens mais publicitadas são projecções nacionais, e como as eleições de 2000 fizeram recordar, no sistema eleitoral presidencial dos EUA o candidato com menor percentagem de votos pode obter maioria no Colégio Eleitoral e vencer as eleições.
As eleições presidenciais nos EUA já fazem história como as mais caras de sempre, ultrapassando pela primeira vez a marca de mil milhões de dólares. Pela primeira vez candidatos de ambos os partidos recusaram o financiamento do governo durante as primárias, por forma a poderem libertar-se dos limites federais sobre os gastos durante esta fase. Só para as eleições primárias, o presidente Bush e o senador John Kerry angariaram um total de quase 500 mil milhões de dólares. E recorde-se que Bush não tinha nenhum competidor nas eleições primárias do Partido Republicano.
Após os respectivos congressos, os nomeados de ambos os partidos receberam 74.6 milhões do governo para a campanha geral. Embora a aceitações destes fundos impeça o angariação de contribuições adicionais por parte dos candidatos e o uso de fundos privados, tal não põe fim à injecção de mais dinheiro na campanha. Há ainda as despesas dos comités nacionais Republicano e Democrata e dos ditos grupos independentes.
Kerry tem surpreendido ao ser capaz de competir financeiramente com a bem oleada máquina de angariação de Bush. As campanhas primárias de Bush e Kerry conseguiram quantias semelhantes (243.7 e 229.6 milhões, respectivamente), mas o Comité Nacional Republicano tem sido capaz de recolher uma quantia superior ao Democrata (271 face a 178 milhões, respectivamente, até 31 de Agosto). Para diminuir a diferença, Kerry tem beneficiado de apoio através dos grupos independentes (como o Sindicato Internacional de Empregados de Serviços ou a MoveOn.org). Este recorde de despesas ocorre na primeira campanha presidencial desde que o Congresso aprovou a proposta de reforma do financiamentos das campanhas dos senadores McCain e Feingold (a Bipartisan Campaign Reform Act). Esta lei baniu o chamado «soft money», as contribuições ilimitadas das corporações, sindicatos e outros interesses especiais, ou lobbies. Mas os limites ao «soft money» vieram promover a formação de grupos independentes, conhecidos como os 527s, o código do Serviço Receitas Internas sob o qual operam. Estes grupos, que nunca haviam assumido grande importância em prévias eleições e estão em larga medida desregulados, podem aceitar contribuições individuais de milhões de dólares, e já receberam ao todo 275 milhões neste ciclo eleitoral, incluindo 150 milhões para as eleições presidenciais. Entre os grandes contribuintes destes grupos contam-me multimilionários como George Soros, preocupado com a possível reeleição de Bush, que já doou 18 milhões a diferentes grupos apoiando Kerry. A maioria do dinheiro conseguido desta forma vai para anúncios, como os do grupo dos Veteranos de Lanchas Rápidas, que lançaram uma campanha massiva de anúncios televisivos difamando a carreira militar de Kerry. Espera-se que o custos de anúncios televisivos ligados à campanha atinjam os 1.5 mil milhões de dólares, o dobro de há quatro anos. Durante a sua carreira política, os maiores contribuintes para Kerry provieram da indústria das telecomunicações e grupos de advogados, enquanto os maiores contribuintes a George W. Bush foram essencialmente corporações financeiras. Mas quem espera poder encontrar diferenças entre os candidatos inspeccionando as fontes de dinheiro pode desiludir-se: os financiadores das duas campanhas têm convergido. Kerry tem recebido doações de funcionários de companhias que historicamente têm dado grandes contribuições ao Partido Republicano. Entre os dez maiores contribuintes das campanhas de Bush e Kerry existem 4 sobreposições, todas elas corporações financeiras: Morgan Stanley, Citigroup, UBS AG e Goldman Sachs.
Artigo Publicado no Avante! Nº 1610 8 Oct 2004

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