domingo, novembro 14, 2004

Teatro: "Palhaço de mim mesmo"

Saiu hoje de cena a peça de Paulo Mira Coelho "Palhaço de mim mesmo", escrito em homenagem ao actor Ruy de Carvalho. O autor descreve a peça assim:

«O acaso não existe. Tudo parece ter um sentido, mesmo quando sentimos não haver razão para que as coisas aconteçam. Não haverá alguma harmonia entre todos os movimentos dos astros, as coisas da natureza ... e o homem? Será por isso que existem os sonhos?
Eis que numa noite de verão, o Fausto é visitado pela sua imagem em velho, para que os seus caminhos se abram e ele se redima dos fantasmas e das angústias e dos medos. O Ancião Fausto explica como é que um homem se pode inserir nessa tal harmonia. Fala-lhe do passado, lembra-lhe os erros, as culplas, todas as culpas de outras vidas, noutros corpos, chamando-lhe a atenção para um simples gesto de bondade, naquele ténue momento onde o sentido da vida fica mais claro. O Fausto resiste ao peso do Ancião, muito embora apenas pelo tempo necessário de sentir o toque da tal harmonia que a natureza põe ao nosso dispôr em tudo o que cria. O Ancião fala-lhe com uma clarividência comovedora, com
palavras simples e certeiras. Mostra-lhe o exemplo de um palhaço que não há maior beleza do que o sorriso de uma criança. Porque um PALHAÇO é apenas um trapalhão à procura de fazer os outros felizes. É uma alma que nada mais quer do que mostrar o amor pelas coisas simples, através de uma gargalhada franca, um abraço fraterno, ou uma pantomina sobre o ridícuulo. E o nosso Fausto olha-se
como nunca se viu. Os hábitos, os vícios e os medos ficam como símbolos daquilo que ele foi um dia, naquelas horas de sombra que quase acabaram com tudo. Hoje, o Ancião propõe-lhe um recomeço merecido, para que nada neles acabe em trevas.»



A actuação é comovente em momentos (durante as confissões de Fausto, quando reconta a história do menino querendo a boneca para a irmã falecida), por vezes cómica (a ironia do Ancião Fausto), e sobretudo filosófica. Por vezes em demasia, pois um diálogo socrático poderá ser interessante, mas não faz necessáriamente bom teatro. E à peça faltou um pouco mais de pendor dramático. A fundamental é claro a transformação de Fausto, à qual João de Carvalho nem sempre fez justiça.

Nenhum comentário: