sexta-feira, março 14, 2008

Eleições Presidenciais nos EUA I

Tendo escrito sobre as eleições presidenciais para «O Militante», não tive ainda ocasião de escrever aqui na Jangada de Pedra. Mas como ainda há muito por decidir, ainda vou a tempo. É aliás surpreendente que a corrida à candidatura do Partido Democrata (PD) ainda não esteja decidida. Faltam apenas os votos de 8 estados e as regiões de Guam e Porto Rico. A próxima eleição primária é só a 22 de Abril, quando tiver lugar a votação no estado de Pennsylvania, representando 158 delegados à Convenção Nacional do PD. Ficará então a corrida ente Obama e Clinton decidida?

Obama lidera neste momento em termos de números de estados ganhos e na contagem de votos, mas o que conta são os delegados eleitos à Convenção Nacional e os «superdelegados». Segundo as presentes regras do PD, os delegados são eleitos proporcionalmente aos votos, segundo vários círculos dentro de cada estado ; já no Partido Republicano (PR) cada estado funciona como um círculo uninominal: quem ganha o estado, ganha todos os delegados. Assim há casos caricatos: Clinton "ganhou" New Hampshire por uma pequena margem de votos, mas obteve o mesmo número de delegados que Obama. O inverso sucedeu em Missouri. É de assinalar que Obama ganhou vários estados com mais de 70% da votação (Clinton só superou a fasquia dos 60% em Arkansas).

Assim, Obama tem 1,367 delegados vinculados à sua candidatura, enquanto Clinton tem 1,224, sendo necessário obter um total de 2,025 delegados para garantir a nomeação. Estas são projecções, pois o complexo sistema eleitoral estadounidense inclui várias modalidades de votação para os candidatos de cada partido: as eleições primárias e os «caucus».

O termo primárias, no sentido estrito, refere-se apenas aos estados em que as pessoas se dirigem às mesas de voto para ai expressarem o seu voto (num boletim, ou em voto electrónico). Os estados variem em quem pode votar nas eleições para o candidato do PD ou PR. Em alguns estados, o eleitor precisa de estar previamente registado como apoiante desse partido (primárias fechadas). Noutros estados, um eleitor registado como independente pode determinar no momento de voto participar nas eleições do PD ou PR (primárias semi- fechadas). Há mesmo a variante curiosa de um eleitor registado no PR pode votar nas eleições do PD, ou vice-versa (primárias abertas), o que permitiria membros de um partido influenciarem a eleição do candidato do partido oponente (fenómeno conhecido como raiding).

O processo de eleição por «caucus» envolve assembleias locais onde são nomeados delegados para em assembleias de nível autárquico superior, culminando nas assembleias estaduais onde são eleitos os delegados à Convenção Nacional. A expressão de voto nas assembleias varia consoante o estado e o partido. Por exemplo, no PD em Iowa, nas primeiras assembleias reunem-se os eleitores, são apresentadas as candidaturas, e os eleitores agrupam-se na sala da assembleia segundo o candidato da sua preferência. Há então um período de discussão para convencer os eleitores dos outros grupos, após o qual pode haver trocas entre grupos. No fim contabilizam-se o tamanho dos grupos e nomeiam-se os delegados para a assembleia seguinte. Nos estados que têm o processo de «caucus» ainda não foram nomeados estes delegados, podendo apenas estimar-se o seu número com base nas votações nas assembleias inferiores. Embora os delegados eleitos fiquem mandatados para votar num determinado candidato podem mudar a sua intenção de voto.

Mas além dos delegados mandatados pelas eleições primárias e «caucus», o PD tem também a figura do «superdelegado», delegados por inerência que não estão mandatados. São todos os membros do Senado e Casa de Representantes do PD, os governadores, dirigentes do partido, ex-presidentes e líderes do congresso. Ao todo representam um quinto dos delegados na assembleia. Tendo em conta a liderança de Obama de pouco mais de cem delegados, estes 793 «superdelegados» podem ainda ter um peso determinante. Vários «superdelegados» já tornaram pública a sua intenção de voto, declarando o seu apoio a um candidato ou tomando a eleição no seu estado como mandato. Para alguns a intenção de voto é óbvia (e.g., Bill Clinton), mas para cerca de um terço dos «superdelegados» é matéria de especulação. O New York Times dá uma vantagem a Clinton no número de superdelegados, embora insuficiente para superar Obama.

Há ainda um outro factor desconhecido: os estados da Florida e Michigan. As organizações estaduais do PD destes estados não cumpriram as regras nacionais do PD sobre calendarização das eleições. A direcção nacional preveniu os estados que os seus delegados não seriam aceites na convenção nacional, mas a pressão este ano para antecipar as eleições estaduais foi tal que as datas foram mantidas. Os candidatos não fizeram campanha nestes estados, mas as votações tiveram lugar (Clinton ganhou ambos os estados). Dada a proximidade entre os dois candidatos, e o desejo dos estados participarem, procura-se agora encontrar uma solução, que pode passar por aceitar os delegados já eleitos ou refazer as eleições.

2 comentários:

calminha disse...

na verdade li , com atenção mas ainda ficaram tantas duvidas de como este estado democrtico se rege nas eleições...upa.
um abraço

André Levy disse...

Obrigado «calminha». Vou continuar a escrever sobre o processo, e gostava muito de com isso poder esclarecer dúvidas (até minhas). É de facto um sistema complexo, pela sua diversidade de formas e pelo diferente do sistema português.