sábado, abril 25, 2009

25 de Abril Sempre! Beija-me na boca!

35 anos desde o 25 de Abril de 1974.
35 anos desde o dia em que veio abaixo uma ditadura que durou 48 anos. Esperem. Isso em números soa a pouco. É preciso cardinais e em maiúsculas: fascismo que durou QUARENTA E OITO anos.
Depois de tamanho período de tempo sob o medo, a repressão, a opressão a cada canto, a guerra, com resistência heróica, mas também com a prisão, a tortura e a morte, é difícil para mim conceber verdadeiramente o que terá sido a explosão de alegria naquela madrugada de antecipação, e a euforia do 1º de Maio que se seguiu. Acompanhei esses dias enquanto criança de dois anos. Mas a atmosfera naqueles dias era tão forte que mesmo naquele cérebro em formação ficou algo profundamente marcado. De tal forma que não consigo pensar nesse período sem que estremeçam sentimentos vindos do inconsciente.
Muito sucedeu entretanto, e a promessa de Abril continua por cumprir. Muito do alcançado foi sendo destruído por 33 anos de governos de direita. Mas a promessa, o espírito continua. Continua inscrita na Constituição da República Portuguesa (apesar das revisões). Continua nos corações dos que viveram o fascismo e o seu derrube, e daqueles que, como eu, cresceram já libertos do fascismo. Porque a aspiração de um outro Portugal, o Portugal de Abril, continua por cumprir, continua a justificar-se a celebração desse dia no modo como espontaneamente ocorreu naqueles dias: com o povo na rua. Celebração que é também dia de luta: em defesa das conquistas, contra o processo de destruição das suas vitórias, e pela exigência do que ficou por cumprir. Na celebração e defesa da promessa pelo qual lutaram milhares de homens e mulheres.

Celebrado o dia na Avenida da Liberdade, em fraternidade e luta, com amigos e camaradas, é hoje soberba ocasião para partilhar um poema de uma amigo e camarada, que ouvi pela primeira vez, recitada pelo autor, na Festa do Avante! de 2008. A mera leitura não faz jus à sua representação ao vivo, mas o texto é boa expressão do espírito de liberdade de Abril, e do direito conquistado de mandar o poder à badamerda quando ele nos anda a enrabar, sem ser preciso metáforas nem asteriscos: em plena voz.
Beija-me na boca!

Beija-me na boca!
Mesmo quando decides
fechar as maternidades
por achares que é muito mais saudável
parir um filho em andamento
numa ambulância a alta velocidade.

Beija-me na boca!
Mesmo quando preferes
que o trabalho seja precário,
a recibos-verdes ou contratos a um mês,
para que quem trabalha se sinta livre de mudar,
mesmo que para lado nenhum,
e essa mobilidade lhe dê um espírito olímpico.

Beija-me na boca!
Mesmo quando dedicas à cultura deste Povo
uma ínfima parte da riqueza que geres,
no pressuposto de que assim "cimentas" a certeza
de que a cultura só atrapalha
o harmonioso desenvolvimento
de mentes simples e acarneiradas aos ditames
do famoso "Orçamento de Estado" equilibrado.

Beija-me na boca!
Mesmo quando a nossa saúde
se arrasta, dolorosa, pelos corredores
dos hospitais do Estado que é o nosso,
para que possa, enfim, correr para uma clínica privada
onde pode morrer alegremente à porta,
olhando o lugar idílico que não pode pagar.

Beija-me na boca!
Mesmo quando o Saber
vagueia sem qualquer obrigação real
num ensino escolar obrigatório
onde nem sequer sentem a nossa falta,
para facilitar o sucesso da estatística europeia,
como se eles fossem todos estúpidos,
e não estivesse aí a chave do nosso futuro.

Porra! Beija-me na boca!
Que eu gosto que me beijem na boca
quando me estão a foder!!!
Fernando Tavares Marques

Um comentário:

Anônimo disse...

Ah! !!!!!
Mas que poesia é esta?