quarta-feira, junho 03, 2009

Carta ao que pensa abster-se

Há ainda muito eleitor que nem sabe que vão haver eleições para o Parlamento Europeu (PE) este domingo. Outros mais que sabendo não se importam, pois não tencionam ir votar. Estão "desiludidos com a política e com os políticos", "são tudo o mesmo", "o meu voto não conta para nada, fica tudo na mesma". Esta onde de desencanto com processo eleitoral, de descrédito da classe política é alimentada por diversos sectores interessados no status quo, razão pela qual o abstencionista deveria reflectir se não participando não estará precisamente a contribuir para perdurar que tudo fique na mesma. Quer deixar que 40% ou menos da população decida por si quem vai para o PE?

A este respeito, nunca deixa de me causar admiração as capanhas eleitorais e as idas às urnas nas eleições fantoche durante o período fascista em Portugal. Era sabido à partida quem iria ganhar. Mas isso não impediu a realização de grandes comícios de oposição, da ida às urnas (que haveriam de ser depois empacotadas com os votos até dos mortos), e até de alguma esperança que podia ser que desta vez, todos juntos, se obtivesse um resultado tão grande que nem os truques do fascismo o poderiam esconder.

Isto para dizer, que por mais perverso que seja o sistema político, se nos é dado o direito de voto, torna-se um dever ir até à urna. A abstenção é uma demissão da cidadania. Face ao boletim, cada um faz segundo a sua consiciência, vota na organização da sua preferência, no menos mau, arrisca numa força onde nunca havia votado, deixa em branco, ou exprime a sua opinião de forma criativa anulando o voto. O voto em branco ou nulo é contabilizado, e exprime algo concreto. Representa a ida à urna para exprimir uma insatisfação com o sistema ou a descrença nas forças candidatas. A abstenção exprime preguiça, falta de interesse, e, com todo o devido respeito, uma tremenda ignorância política. O voto conta. E cada voto conta. (Vivi intensamente, nos EUA, a prolongada contagem de votos para as eleições presidenciais de 2000) E, embora a democracia não se esgote nas eleições, a votação é um momento importante de participação democrática. É um direito conquistado a muito custo. E que está (como qualquer direito democrático) sob ameaça. Sr. Abstencionista: preferia não ter uma voz no processo político? Acha que os resultados das eleições não vão afectar a sua vida, a da sua família, a dos seus filhos, do seu trabalho e colegas, do ambiente? Pois está muito enganado. Sejam eleições para a junta de freguesia onde mora, sejam para o distante PE, as decisões aí tomadas terão impacto na sua vida. E depois, tendo-se demitido de decidir quem seriam os eleitos, com que moral pode protestar contra acções das quais descorde?

Embora acima tenha indicado que o voto em branco ou nulo é mais expressivo que a abstenção, creio que um eleitor pode fazer um pouco melhor que isso. Felizmente que em Portugal existe uma pluralidade de organizações políticas. O que não faltam são escolhas. Nestas eleições até há forças novas. Partidos grandes, com experiência no Governo, no Poder local; partido pequenos, com figuras reconhecidas e ideias públicas que qualquer interessado por consultar. No meio disso tudo, não encontra uma força onde votar?

Não pretendo estar a escrever um manual de instruções sobre como chegar a uma decisão, até por que o seguinte me parece óbvio. Um eleitor deve primeiro pensar nas questões que considera importantes, para si, para a sua família, para o seu país, para o futuro. Deve procurar, no limite dos seus conhecimentos, pensar quais as respostas que fazem sentido. E depois deve considerar as posições das várias forças políticas, ver as suas propostas, analisar a sua prestação no passado, a coerência entre o que dizem e o que fazem, entre o que prometem e o que praticam. As forças que nunca foram eleitas não têm por que ser excluídas, mas devem ser analisadas também. Qual a capacidade de trabalho da força política em que se vota. Qual o leque de questões a que pode dar resposta? Por outro lado, também não se deve limitar a escolha àquelas forças que podem "ganhar". Isto não se trata de uma aposta. Não se ganha um prémio se se votar na força que obter mais votos. Nem é voto deitado ao lixo, votar numa força que fique em 3º, 4º, 5º ou 10º lugar. Há que considera creio, sem desrespeito pelas forças geralmente não eleitas, em que medida contribui votar num dos partidos do bloco central versus reforçar o voto nas forças de efectiva oposição. Há quem defenda o primeiro, apelando à necessidade de estabilidade. Estabilidade tivemos nós, em Portugal, durante 48 anos. O que precisamos em Democracia não é estabilidade, mas o confronto de ideias, a consideração de diferentes interesses e classes sociais.

Havendo dúvidas sobre soluções, sobre os programas de determinadas forças, nada melhor que os estudar, ou conversar com amigos ou militantes dessas forças. É nesse diálogo face a face que melhor se esclarecem as dúvidas e passámos a conhecer algo também importante: o carácter e postura dos militantes das forças políticas.

A tendência para a abstenção nas eleições para o PE é particularmente séria. A Europa parece estar lá longe; mas está nas mesas dos nossos governantes nacionais e locais, está nos nossos bancos (através do controle da taxa de juro do Euro), nas verbas disponíveis para construção de infraestruturas, na forma que as frutas de mercearia podem ter, se os centros de saúde se vão expandir ou fechar. O voto no PE tem portanto efeitos bem locais e nacionais.

Mas ainda por cima, vota-se para o Parlamento Europeu, que na Europa, não é um orgão de muito poder, onde Portugal está diluído entre todos os outros países membros, e onde quem tem mais poder executivo é a Comissão Europeia, o Presidente do Banco Central Europeu, e outros, nos qual não votámos directamente. Mas os deputados do PE não deixam de jogar um papel em Bruxelas e Estrasburgo, influenciar a política da Comissão Europeia, e os deputados europeus podem ter um papel importante defendendo questões nacionais e esclarecendo os cidadãos nacionais dos efeitos e consequências das políticas da Europa. Há que ter consciência também que as forças políticas que elegemos em Portugal, se organizam no PE em grupos. Fortalecer uma força política em Portugal implica também fortalecer esses grupos.

Já tenho neste blog apelado ao voto no PE que a mim me parece evidente. Posso discutir questões concretas, mas talvez o melhor seja explicar o meu voto. Eu acho que esta União Europeia está dominada pelo grande capital e pelos países que os representam. Pode escorregar algum dinheiro para os países periféricos, mas apesar das melhorias pontuais, a convergência não se tem verificado. Veja-se a distância entre Portugal, Grécia, ou até Irlanda face ao centro da Europa. Tem sido a EU a empurrar os governos nacionais portugueses (que não ofereceram grande resistência) a privatizar diversos sectores produtivos e de serviços, e a reduzir os direitos laborais. Se a França tem um excesso de produção agrícola, Portugal tem de reduzir a sua produção, ainda que ao fazê-lo ponha em causa a sua soberania alimentar e capacidade de se autosustentar. Se à Europa Central convém mudar a taxa de juro, o Banco Central Europeu muda essa taxa para toda a zona Euro, mesmo que tenha efeitos negativos para países periféricos. Os tratados europeus são acordados entre as chefias governativas, sem consideração ou desrespeitando as opiniões populares expressas em referendo. A sua organização segue um modelo federal, como se fossemos os Estados Unidos da Europa, limitando cada vez mais a soberania política, económica e social de cada país. E o novo Tratado de Lisboa vem reafirmar a tendência já expressa pelo aprofundamento do envolvimento da UE no seio da NATO: a UE quer tornar-se um potência militar. Esta UE, neo-liberal, federalistas e militarista não é a Europa que eu desejo. E só há uma força política que se opõe firmemente sobre estas três questões, que estão interligadas: a CDU.

Os partidos parlamentares de Direita (incluindo o PS), ainda que tenham aprovado, como toda a Assembleia, uma reforma da Constituição Portuguesa para permitir referendar a "Constituição Europeia", recusou referendar o "Tratado de Lisboa. E por muito que estes partidos, incluindo o o Sócrates desde o Congresso do PS, façam uma crítica ao neo-liberalismo e os "seus excessos", a verdade é que ainda apoiam, e no caso do Sócrates constitui até motivo de orgulho, o Tratado de Lisboa, que no seu fundamental é um programa neo-liberal ao nível económico e social. Sócrates até converge, por razões patrióticas (?!) em apoiar a contiuição de Durão Barroso como Presidente da Comissão Europeia, indo contra a opinião do Grupo Socialista Europeu, e a tímida opinião do seu cabeça de lista ao PE (que depois "corrigiu" a sua opinião – grande independente).

Mas não fugindo à questão do eleitor de esquerda que poderá estar indeciso entre votar Bloco de Esquerda ou CDU: confesso que a posição do BE sobre a natureza federal da UE é ambígua. Parece ter a ilusão que dissolvendo a soberania nacional poderá ser uma via de libertação para Portugal. Há alguma convergência nas posturas anti-neo-liberais e anti-militaristas: afinal tanto o BE como a CDU pertencem ao mesmo grupo do PE, o GUE/NGL. Mas por exemplo, o BE revela a sua tendência federalista ao apoiar o projecto de construção de um Partido de Esquerda Europeia, enquanto a CDU não tem participado nesse projecto partidário federal, por preferir a convergência multi-lateral entre partidos intependentes.

Por outro lado, vejo nos deputados da CDU, seja no PE seja na Assembleia da República seja no Poder Local, uma entrega e capacidade de trabalho que não vejo noutras forças. "Não apresentam propostas" dizem os ignorantes sobre a oposição. Pois a eleitos pela CDU no PE são dos que mais propostas têm apresentado de entre todos os Portugueses. E há um detalhe, que não é mencionado pelos candidatos durantes as campanhas, mas que é muito representativo dos interesses que são defendidos pelos eleitos da CDU: qualquer que seja o salário base de um deputado, um eleito pela CDU não é beneficiado nem prejudicado na sua remuneração. Isto é, exerce a sua actividade não para benefício financeiro pessoal, para apenas para defender os interesses dos seus eleitores, os interesses nacionais, dos trabalhadores e do povo. A diferença entre o salário de um qualquer deputado e o salário que o eleito do PCP receberia caso não fosse eleito, é entregue ao Partido, contribuindo assim para garantir a independência de classe deste Partido.

2 comentários:

Fernando Samuel disse...

Boa reflexão: convenceste-me...

Um abraço.

Anônimo disse...

... A mim também!