sábado, outubro 04, 2008

Abracadabra: reverte-se decisão do Congresso

O plano Paulson-Bush voltou à Casa de Representantes nos EUA e foi aprovado, com 263 votos a favor, 171 contra. Havia sido chumbado antes com 228 contra, 205 a favor (ver), em larga medida por oposição ideológica e eleitoralista dos Republicanos. A mudança de voto deveu-se à alteração do sentido de voto de 33 Democratas e 24 Republicanos. Diz a representante Rep. da Carolina do Sul Sue Myrick:
Posso perder a eleição à conta deste voto, mas não faz mal porque acredito no coração estar a tomar a opção correcta. (ver)
Ou Lee Terry, do Nebraska, outro Republicano que trocou de voto:
Aqueles porcos gananciosos de Wall Street não merecem a ajuda dos Estaunidenses que trabalham no duro. Mas permitir que eles falhem causaram tantas outras empresas ... a perder acesso a crédito, e a perder negócio.
Não foi só a pressão presidencial e o espectro de colapso alimentado pelos vários quadrantes, incluindo ambos os candidatos presidenciais, que conduziu à inversão do voto. Como é prática no Congresso, às propostas vão sendo anexadas outras iniciativas. A proposta inicial de 3 páginas transformou-se no Acto de Emergência de Estabilização Económica, com 451 páginas. A proposta central continua a ser dar autoridade ao Secretário do Tesouro para comprar bens a instituições financeiras em falência e oferecer crédito, até USD$700 mil milhões.

Mas além desta medida, cuja efectiva capacidade para estabilizar o mercado financeiro está longe de ser assegurada (ver), o Senado, por exemplo, anexou-lhe um corte fiscal no valor de $100 mil milhões de dólares. Algumas medidas positivas são meros "pensos": limites sobre os pagamentos aos executivos cujas firmas vendem bens ao governo, medidas para evitar que hipotecários percam a casa, maior fiscalização pelo Congresso, e a autoridade do Congresso congelar os segundos $350 mil milhões, caso o plano não esteja a funcionar.

Nota histórica curiosa: o New York Times aponta para uma decisão de 2004 como podendo ter precipitado a presente crise financeira. A 28 de Abril desse ano, os 5 membros da Comissão de Títulos e Divisas (Securities and Exchange Commission), organismo Federal que tem a incumbência de fiscalizar o mercado financeiro,reuniu para considerar um pedido dos grandes bancos de investimento, incluindo a Goldman Sachs, então liderada por Henry Paulson (o actual Secretário do Tesouro, e principal promotor da actual medida do governo). Os bancos queriam uma isenção para as comissões dos seus corretores de uma regulação que limitava o limite de dívida que estes podiam assumir. "A isenção libertaria milhares de milhões de dólares retidos como reserva, caso perdessem os seus investimentos. Esse fundos poderiam então àos bancos investir no crescente mercado de títulos cobertos por hipotecas, derivados do crédito usado como seguro para detentores de obrigações, e outros instrumentos exóticos." A medida foi aprovada, reduzindo o papel regularizador do estado federal, transferindo-o para os bancos. Outras agências federais aprovaram outras medidas de desregulamentação. Viva o neoliberalismo e a redução do papel do estado!

Passados alguns anos, veja-se o estado da economia financeira quando esta se regula a si mesma. O Congresso e Casa Branca acabam de passar a maior intervenção federal no mercado financeiro desde a Grande Depressão. Para por o valor ($700 mil milhões de dólares) em perspectiva, Henrique Custódio, no Avante!, indica que este valor ultrapassa os orçamentos anuais conjuntos dos ministérios Estadunidenses da Educação, Saúde e Defesa (só este é gigantesco), e que corresponde ao triplo do PIB português (actualmente nos 232 mil milhões dólares/ano). Quem diria, que nos seus meses finais de presidência, Bush viria a imitar Roosevelt, a abandonar os preceitos do Neoliberalismo e seguir uma linha Keynesiana.

Uma última nota sobre a crise financeira, esta a nível nacional. O secretário-geral do PCP, Jerónimo de Sousa, leu perante toda a comunicação social, um comunicado de análise da crise internacional e como poderá afectar Portugal, desmascarando a natureza do capitalismo, e propondo algumas medidas urgentes que o governo português deveria tomar (vejam lá, oh pregadores anti-partidos, fez propostas!). No dia seguinte, durante uma reunião de quadros da Organização Regional de Lisboa, com vista à preparação do XVIII Congresso do PCP, chamou à atenção que apesar da presença dos jornalistas, o comunicado passou desapercebido na comunicação social, tendo o PCP recebido contactos por parte de jornalistas que explicavam que haviam feito o seu trabalho, de preparar as peças sobre o comunicado, mas que estas haviam ficado presas nas mesas dos chefes de redacção. Assim funciona a imprensa nas mãos do grande capital: não publicam vozes e propostas que tocam na barriga do monstro.

Um comentário:

Teresa disse...

pelos vistos, só saiu o comentário do Vilarigues no Público, a queixar-se do mesmo. Isto não quer dizer que no jornal apresente ou comente nenhuma das propostas. O que é interessante é que sai perto de uma notícia sobre a concentração dos media. Em nenhuma parte vi explícita a subordinação do Público ao grupo Sonae. Seria interessante saber qual o bonus dado ao director do mesmo na sua cruzada em favor do neo.liberalismo