Primeiro, embora a posição de presidente, pelo carácter nacional, ser distinta, há muitos anos que Africano-americanos são eleitos nos EUA para câmaras, assembleias estaduais, e como representantes de estados ao Congresso. Já ocuparam também lugares do governo, caso de Colin Powell e Condelezza Rice, cujas prestações lamentáveis não retira o facto de serem Africano-americanos.
Segundo, Obama nunca fez da sua origem étnica uma questão eleitoral, nem a sua campanha encontra traços evidentes da agenda das organizações Africano-americanas, como foi o caso das campanhas, por exemplo, de Jesse Jackson e Al Sharpton. Pelo contrário, Obama fez por tudo para não ser o "candidato negro", chegando ao ponto de distanciar-se de Jesse Jackson, que não foi solicitado a prestar publicamente o seu apoio nos eventos da campanha de Obama, ou do seu pastor, acusado de radical. Foi uma opção política. Quis evitar o rótulo de "candidato negro" para ser o candidato da mudança para todos. Consegui-o por mérito próprio, do contexto social e económico dos EUA, da desastrosa experiência de Bush na casa branca, e à conta de muito dinheiro investido na campanha. Houve até maior esforço por parte da máquina conservador em pintá-lo como muçulmano (um dos seus nomes é Hussein), ou associado a terroristas domésticos, ou, na fase final da campanha, como socialista por querer "redistribuir a riqueza". Tendo em conta o nível de desigualdade económica nos EUA querer equilibrar um pouco a riqueza nacional não é sinal de socialismo. É sinal de que não mentecapto. Qualquer economista de mercado com dois dedos de testa entende que não é possível haver consumo nacional se deixar de haver classe média, e sobrar apenas uma pequena faixa de muitíssimo ricos rodeados sobretudo de classe pobre-baixa e média-baixa.
O Público de hoje traz uma notícia onde se lê «França nomeia primeiro prefeito de origem africana e entra (sem o dizer) na era Obama - Governo francês diz qu

Será o "efeito" só válido para o mundo euro-cêntrico? Que a eleição de Africanos na Eur

Resume-se o "efeito Obama" à cor da pele? Isso parece-me uma ofensa à inteligência política e outros méritos individuais do Obama, de Pierre N'Gahane–o primeiro prefeito de origem africana nomeado para a perfeitura de Alpes de Haute Provence, no Sudeste da França–e de qualquer outro candidato, ou mesmo qualquer pessoa.
«Os Contemporâneos» ilustraram o ridículo deste suposto efeito em Maio, antes da eleição de Obama, com a escolha pelo PSD do candidato Buraka Obama. (Obrigado Rapariga Vermelha pela referência:)
Um comentário:
Recebi por e-correio este comentário interessante:
A Europa, e Portugal em particular, trouxeram escravos africanos para a Europa desde muito cedo (ficou tristemente célebre o primeiro mercado de escravos em Lagos no séc. XV). Em Portugal foram empregues sobretudo nos serviços domésticos e nos trabalhos agrícolas do Alentejo e Madeira. No distrito de Setúbal há uma aldeia onde, ainda não há muito tempo, a maioria da população era visivelmente afro-descendente, e no distrito de Beja a vila de Garvão surge num adágio popular como «terra dos negros» (isto para não falar nos contingentes populacionais que chegaram de África nos tempos romanos e islâmicos, pouco significativos, ou ainda dos que foram chegando nos séculos XIX e XX, até 1974).
Claro que nunca tiveram representação política e visibilidade pública (com muito raras excepções), então e mesmo depois da revolução democrática, por racismo. E se esses grupos têm tido mais representatividade ultimamente, naturalmente por causa da imigração, democratização e pelas razões que apontas, a verdade é que tal tem acontecido só muito depois do continente americano de um modo geral (mesmo em países onde os afro-descendentes não são maioritários). É por isso que não posso deixar de discordar contigo quanto ao "efeito Obama". Ele existe na Europa, sim, mas com um propósito muito claro (estimulado pelo Estado e pela comunicação social): potenciar a integração individual das elites emergentes afro-descendentes directamente num sistema que é tipicamente pós-colonial e racista, evitando simultaneamente que cumpram totalmente as suas naturais e legítimas expectativas de emancipação colectiva. Tenta-se mostrar que tudo acontece por quase nada, numa conveniente política “fast”. É muito perverso mas previsível, parece-me.
Ao que respondi:
Agradeço-te os apontamentos muito interessantes sobre os escravos em Portugal, que eu desconhecia de todo (e também o emprego da expressão 'afro-descendente').
Se bem compreendi a tua posição sobre o "efeito Obama", achas que a eleição de afro-descendentes não é fruto simplesmente do mérito dos indivíduos em causa, mas que há uma procura por parte do sistema de, por um lado, integrar as elites étnicas que vão surgindo (isto é alargar a representação da classe capitalista) e lavar-se de percepções que seja discriminatório.
Eu até subscrevo essa ideia. Parte da minha irritação com a expressão deriva de estar associada ao Obama, tendo em conta o que escrevi sobre a sua candidatura, e a existência de outros eleitos afro-descendentes nos EUA. Claro que o presidente é mais importante, mas o Obama não é qualquer um. Se fosse um Bush negro, disléxico e ignorante, não teria ganho as primárias. É claro que ele teve o apoio de sectores das elites brancas nos EUA (incluindo os bem importantes bancos), mas custa-me a querer que tenham primeiro pensado "que bom que seria ter um candidato negro" e depois tenham encontrado o Obama. Depois dele ter dado nas vistas alguns sectores do Partido Democrata podem ter visto nele uma resposta à questão da integração das elites afro-descendentes (que no seio da economia dos EUA tem muito pouco peso nacional, terão peso em algumas regiões), mas (acho eu) primeiro terão notado o seu poder de oratória, e a resposta da convenção nacional em 2004. Não estou com isto a defender a sua plataforma, apenas a dizer que (contrariamente ao Bush) é uma pessoa com óbvio méritos individuais. Há que não esquecer também que a sua candidatura nas primárias foi um risco, para um jovem senador, e a confirmação da sua eleição tardou.
Em todo o caso, creio que a tendência que traçaste me parece correcta, à medida que minorias étnicas vão penetrando nas classes do sistema, é inevitável que subam a lugares de poder. Mas por serem representantes da sua classe social, e não da sua etnia (como também tentei argumentar no caso de Obama) a situação dos seus grupos étnicos não melhora necessariamente por causa da sua eleição.
Postar um comentário